Decisão do STF sobre suspender emendas eleva tensão entre os Três Poderes

Suspensão de trecho de projeto reacende embate entre Congresso, STF e Executivo sobre controle do Orçamento da União

A decisão do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), Flávio Dino, de suspender trecho do projeto de lei que autoriza emendas do “orçamento secreto” aumenta o nível de atrito institucional entre os Três Poderes.

A medida foi tomada em uma ação apresentada por deputados federais do PSOL e pelo partido Rede Sustentabilidade, que pediram ao STF que impedisse a sanção do projeto aprovado pelo Senado na última quarta-feira (17).

decisão tem caráter preventivo, já que o texto ainda não foi sancionado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A liminar ainda será submetida ao referendo do plenário da Corte.

Embora o projeto tenha como objetivo aumentar a arrecadação da União, o texto aprovado pelo Congresso inclui um trecho que permite a revalidação de emendas parlamentares não pagas entre 2019 e 2023, por meio da retomada de restos a pagar já cancelados, despesas autorizadas, mas não quitadas dentro do prazo legal.

Na prática, essa medida abriria espaço para o pagamento de despesas ligadas às emendas de relator, conhecidas como “orçamento secreto”mecanismo que o STF derrubou em 2022 ao considerá-lo inconstitucional por falta de transparência e critérios objetivos. Essas emendas permitiriam ao Congresso autorizar gastos fora do Orçamento.

Segundo especialistas ouvidos pela CNN Brasil, a decisão de Flávio Dino representa, na verdade, um embate institucional entre o Parlamento e o Supremo, com alinhamento do Judiciário ao Executivo na limitação do poder do Congresso sobre o Orçamento da União.

“O que estamos assistindo é algo mais amplo: um embate entre o Legislativo e o Judiciário por conta da questão orçamentária, que decorre do fato de que o Executivo perdeu o controle do orçamento lá no governo [Michel] Temer, com o orçamento impositivo”, afirmou Leandro Consentino, cientista político e professor do Insper.

De acordo com ele, sempre que o Legislativo busca a via das emendas para atuar de forma mais autônoma, o Executivo consegue mobilizar parte de sua base política para judicializar a questão e fazer uma dobradinha com o Judiciário, barrando esse tipo de recurso e tentando manter a prerrogativa orçamentária sob controle do governo federal.

“O Judiciário faz uma espécie de tabelinha com o Executivo contra o Legislativo”, acrescentou o professor.

Leandro Gabiati, cientista político e diretor da Dominium Consultoria, avalia que, no caso específico da LOA (Lei Orçamentária Anual) de 2026, o acordo para liberar restos a pagar de anos anteriores foi feito entre o Planalto e o Congresso.

Ainda assim, ele observa que Executivo e Judiciário parecem implicitamente alinhados para impor limites ao crescente poder do parlamento sobre o Orçamento da União.

A decisão de Flávio Dino se insere em um histórico de confrontos entre o STF e o Congresso sobre a execução de emendas parlamentares. Nos últimos meses, a Corte tem buscado estabelecer limites e ampliar a transparência orçamentária, enquanto parlamentares tentam preservar esses instrumentos de alocação direta de recursos em suas bases eleitorais.

Na sexta-feira (19), o Congresso aprovou a proposta da Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2026, que prevê cerca de R$ 61 bilhões destinados exclusivamente a emendas parlamentares.

“O caso certamente terá novos desdobramentos, seja pela decisão de Dino sobre a LOA de 2026, seja a partir da recente operação da Polícia Federal na Câmara. Não pode ser descartada algum tipo de resposta político-institucional do Congresso direcionada ao STF”, concluiu Gabiati.

Fonte: CNN Brasil