Grandes poluidoras estão ligadas a metade do aumento da intensidade das ondas de calor no mundo, aponta estudo
Pesquisa inédita publicada na revista Nature mostra que empresas de combustíveis fósseis e cimento responderam por cerca de 50% do agravamento de eventos extremos entre 2000 e 2023. Sem a mudança climática provocada pelo ser humano, um quarto dessas ondas de calor teria sido praticamente impossível.
Um estudo inédito publicado na revista científica Nature nesta quinta-feira (11) aponta que cerca de 50% do agravamento de eventos extremos entre 2000 e 2023 pode ser ligado diretamente às emissões das 180 maiores produtoras de combustíveis fósseis e cimento do planeta.
O grupo, conhecido como “carbon majors”, inclui gigantes como ExxonMobil, Saudi Aramco, Shell, BP e Gazprom, além de estatais e companhias de menor porte espalhadas em diversos países.
A pesquisa analisou 213 ondas de calor registradas em 63 países ao longo das últimas duas décadas e concluiu que, sem a influência da mudança climática causada pelo ser humano, ao menos um quarto desses episódios teria sido “praticamente impossível”.
O levantamento mostra também que as ondas de calor se tornaram 20 vezes mais prováveis nos anos 2000 e até 200 vezes mais frequentes na década seguinte, em comparação ao clima pré-industrial (1850–1900).
➡️ ENTENDA: Uma onda de calor é um fenômeno meteorológico que acontece quando uma determinada região registra temperaturas muito acima da média por uma sequência de dias.
- No geral, os meteorologistas estabelecem que, para o fenômeno se configurar, as temperaturas precisam ficar ao menos 5ºC acima da média por um período de cinco dias ou mais.
- Já o Inmet define uma onda de calor quando há um aumento de 5ºC na temperatura em relação à média mensal, independentemente da quantidade de dias de duração.
Os dados do estudo revelam também que a intensidade média desses eventos subiu em ritmo acelerado: 1,4 °C entre 2000 e 2009, 1,7 °C entre 2010 e 2019 e 2,2 °C nos quatro anos mais recentes.
Em 55 casos, as ondas de calor analisadas só ocorreram porque o planeta já havia aquecido devido à ação humana.
O estudo destaca ainda que a responsabilidade não se concentra apenas nas grandes multinacionais do setor.
Mesmo empresas de menor porte tiveram contribuição significativa: em alguns casos, suas emissões foram suficientes para tornar possíveis entre 16 e 53 ondas de calor que não teriam acontecido em um clima estável.
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Usinas termoelétricas a carvão estão entre principais emissoras de carbono na atmosfera. — Foto: AP Photo/Charlie Riedel
Segundo os autores, a metodologia utilizada representa um avanço científico porque permite atribuir não só a influência da mudança climática em cada evento extremo, mas também quantificar a responsabilidade de empresas específicas.
Para especialistas, os resultados oferecem novas ferramentas para políticas públicas e podem reforçar ações judiciais que busquem responsabilizar grandes poluidoras por perdas e danos relacionados ao aquecimento global.
“O artigo de Quilcaille e colegas faz um caso convincente de que ondas de calor ao redor do mundo foram agravadas pela queima de combustíveis fósseis produzidos, em sua maioria, por um número limitado de empresas. Esses estudos são essenciais para qualquer esforço de responsabilizar as ‘carbon majors’ nos tribunais”, escreveram os juristas Michael B. Gerrard e Jessica A. Wentz, do Sabin Center for Climate Change Law da Universidade Columbia (EUA) em um comentário publicado na mesma edição da Nature.
Eles lembram, porém, que transformar essa base científica em condenações judiciais ainda é um desafio:
“Até agora, nenhum tribunal no mundo responsabilizou financeiramente os emissores pelas mudanças climáticas. O problema não é a fraqueza das evidências científicas, mas as várias questões legais que precisam ser resolvidas antes de os cientistas subirem ao banco das testemunhas”, afirmam.
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Ondas de calor se tornaram mais frequentes e intensas no Brasil. — Foto: Prefeitura de Jundiaí/Divulgação
Fonte: G1