Brasília pode perder título de Patrimônio Cultural da Humanidade? Unesco avalia ‘estado de conservação da cidade’ em 2025

Dúvida surge com aprovação do Plano de Preservação (PPCUB) que permite modificações na área tombada e aguarda sanção do governador Ibaneis. Especialista diz que texto altera planejamento original da capital federal.

Desde 1987, Brasília é considerada Patrimônio Cultural da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). O questionamento sobre a perda do título surgiu com o Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília (PPCUB), aprovado pela Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) e que propõe regras para construções na área tombada da capital federal.

Para saber a resposta, é preciso entender o que dá esse título a Brasília e o que o PPCUB altera (veja mais abaixo). O Plano de Preservação, que é um projeto do governo do DF, aguarda a sanção – ou os vetos – do governador Ibaneis Rocha (MDB).

A Unesco explica que o Comitê do Patrimônio Mundial vai avaliar, em 2025, o estado de conservação de Brasília. A entidade fornecerá comentários e recomendações para identificar soluções que preservem “os valores da cidade”.

“Está previsto o envio, em 2024, de um relatório atualizado sobre o estado de conservação de Brasília ao Centro do Patrimônio Mundial, a ser analisado na 47ª Sessão do Comitê do Patrimônio Mundial em 2025“, diz a Unesco.

 

Para o professor Benny Schvarsberg, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília (FAU-UnB), o PPCUB apresenta problemas e altera planejamento original da capital, mas uma avaliação depende do que será feito pelo governador.

Por que Brasília é patrimônio mundial?

 

 Esboço do Plano Piloto de Brasília — Foto: Arquivo Público do Distrito Federal/Fundo Novacap

Esboço do Plano Piloto de Brasília — Foto: Arquivo Público do Distrito Federal/Fundo Novacap

O professor Benny Schvarsberg explica que Brasília é tombada graças ao seu conjunto urbanístico-arquitetônico, feito a partir do projeto de Lucio Costa para a construção da capital, apresentado em 1957.

O planejamento foi inscrito no Livro de Tombo Histórico pelo Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Em 1987, a Unesco reconheceu o conjunto urbano como Patrimônio Mundial.

“É uma cidade única, representa o ideal urbanista modernista. É a maior cidade moderna tombada”, diz Benny Schvarsberg.

 

Brasília tem tombamento urbanístico, ou seja, edifícios podem ser construídos, modificados, mas respeitando a proposta de Lucio Costa. Benny Schvarsberg explica que há quatro escalas de tomabamento da capital:

  • Residencial, com a organização das superquadras;
  • Monumental, que envolve as construções no eixo monumental;
  • Gregárias, que trata dos locais onde as pessoas “se agregam”, como as áreas comerciais;
  • Bucólica, que representa as áreas verdes.

O que muda com o PPCUB❓

O projeto propõe regras sobre o que pode e o que não pode ser feito na área tombada da capital federal. Entre as mudanças aprovadas estão:

  • Setores de Clubes Norte e Sul: criação de lotes;
  • W2 Sul: mudanças no traçado;
  • Noroeste: desconstituição de lotes – mesmo em área de relevante interesse ecológico;
  • Setor de Embaixadas Norte e Sul: construção de comércios varejistas que vendam alimentos, bebidas e cigarro. Também serão autorizadas lojas de materiais de construção;
  • Setor Hoteleiro Norte e Sul: construção de prédios mais altos, a poucos metros da Esplanada dos Ministérios. Os hotéis mais baixos poderão chegar a 35m de altura, passando de 3 para 12 andares;
  • Final da Asa Sul: libera lojas, restaurantes e um camping no gramado que fica no fim do Eixão Sul, perto do viaduto da L4 Sul;
  • Quadras 700 e 900 Sul e Norte: possibilidade de construção de pousadas, apart-hotéis, hotéis e motéis.

PPCUB traz riscos para o título de patrimônio❓

O professor Benny Schvarsberg afirma que o PPCUB permite alterações na concepção original de Lucio Costa, e é justamente a proposta inovadora e modernista de Lucio Costa que fez com que a capital fosse tombada.

“Da forma como ele foi aprovado pela Câmara, ele tem problemas sim quanto as alterações de uso, destinação da construção, e ocupação, forma, altura, volume, afastamento”, afirma Benny Schvarsberg.

No entanto, o professor diz que para avaliar se o risco de perder o título é real, é preciso aguardar como ficará o texto do projeto após a sanção do governador. Ibaneis Rocha adiantou que deve vetar “pontos polêmicos” após reações negativas.

Caso o Iphan avalie que há pontos críticos, o órgão deve pedir para governo reavaliar o proejto.

Benny lembra que, após a sanção, ainda caberá uma análise final do Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que vai avaliar até que ponto as alterações podem ser “agressivas” ao projeto de tomabento.

Em entrevista à TV Globo, o secretário de Desenvolvimento Urbano e Habitação, Marcelo Vaz, disse que não há possibilidade de Brasília perder seu título.

“O texto [do PPCUB] foi todo pensado com diretrizes de preservação, há uma parte específica que coloca tudo aquilo que tem que ser seguido pra que Brasília continue com o título, continue sendo esse maior sítio urbano tombado do mundo”, diz Marcelo Vaz.

O que diz a Unesco

Em nota, a Unesco explica que segue um procedimento padrão nos casos que envolvem os sítios do Patrimônio Mundial. O Centro do Patrimônio Mundial, sediado em Paris, é a instância responsável pela análise de informações relativas ao estado de conservação e possíveis intervenções em sítios do Patrimônio Mundial.

É para lá que será enviada a documentação sobre a preservação de Brasília. Em 2025, a Unesco fará a análise do material com a ajuda dos órgãos consultivos, e vai fornecer comentários técnicos e recomendações, conforme o caso.

A entidade afirma que, em geral, se estabelece um diálogo técnico para identificar soluções sustentáveis que preservem os valores do sítio em questão.

“Estamos confiantes que será possível encontrar a melhor solução”, diz a Unesco.

Vetos previstosao PPCUB

No fim de junho, o governador Ibaneis Rocha afirmou que vai vetar pontos do PPCUB. A decisão foi tomada depois de uma reunião com a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Seduh).

No entanto, as alterações ainda precisam ser confirmadas com a sanção do projeto. De acordo com o governo, serão vetados:

  • Alojamentos nas quadras 700 e 900 das Asas Sul e Norte. Com isso, está descartada a possibilidade de construção de motéis, apart-hotéis e flats nessas quadras;
  • Alteração nos lotes da W3 Sul e a permissão de comércio e prestação de serviços no setor de embaixadas;
  • Permissão de alojamento no Parque dos Pássaros, no final da L4 Sul – o que afasta a possibilidade da construção de um camping no local.
Fonte: G1.

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